AS SOMBRAS DE 1964 E DE 1989: a manipulação pela mídia como estratégia da direita.

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Autores: Sandro Ari Andrade de Miranda (advogado no Rio Grande do Sul e mestre em ciências sociais), e Luciana Leal de Miranda (advogada no Rio Grande do Sul).

 

O gaúcho João Goulart não pode ser considerado como um Revolucionário. Mas o seu governo foi marcado por uma radicalização dos movimentos sociais e sindicais, por uma aproximação com a esquerda política, e pela proposta das reformas de base.

Herdeiro da tradição Getulista, e seguidor de Leonel Brizola, alicerçado nos movimentos sociais, e inspirado nas obras de intelectuais como Celso Furtado e Paulo Freire, João Goulart apresentou como necessárias as seguintes reformas:

  1. Reforma agrária, que não se resumia à redistribuição de terras não utilizadas ou subutilizadas, mas compreendia a realização de obras de irrigação, drenagem e açudagem.
  2. Reforma educacional, com a valorização do magistério e do ensino público em todos os níveis, o combate ao analfabetismo, além de uma reforma universitária.
  3. Reforma fiscal ou tributária, que incluía a proposta de limitação da remessa de lucros para o exterior, sobretudo por parte das empresas multinacionais.
  4. Reforma eleitoral, com a extensão do voto aos analfabetos, na época significativa parcela da população, e com a legalização do Partido Comunista Brasileiro.
  5. Reforma urbana, visando ordenar o espaço que sofria com um grande processo de migração do campo para as cidades, em razão da industrialização e, consequentemente em busca de melhores condições de trabalho, já que o trabalhador rural ainda estava aprisionado ao coronelismo. E
  6. Reforma bancária, para ampliar o acesso ao crédito pelos produtores.

Como resultado, Jango enfrentou forte oposição da direita udenista, que tinha como expoente o Governador do Estado da Guanabara, Carlos Lacerda. Este criticava a “corrupção” do governo e a crescente aproximação do Presidente com os comunistas.

Em 19 de março de 1964, o Brasil assistiu um dos momentos mais grotescos da sua história, com a “Marcha da Família com Deus pela Liberdade” , na cidade de São Paulo, cujo objetivo principal era mobilizar a opinião pública contra o governo de Jango e a política de reformas que, segundo eles (os envolvidos na Marcha), culminaria com a implantação de um regime comunista ao estilo soviético no Brasil.

Na prática, esse movimento medíocre tinha por verdadeiro objetivo barrar as reformas de base sustentadas por João Goulart e assim manter o seu poder intacto. Com o fracasso do movimento, em 1º de abril de 1964 foi instaurado o Golpe Militar e a deposição do Presidente que havia sido eleito.

Na época, o Brasil tinha um sistema eleitoral estranho, com a possibilidade de eleição de um Presidente e de um Vice por meio de partidos distintos. Quem foi eleito para o cargo superior da nação havia sido o excêntrico Jânio Quadros com a sua “vassourinha” contra a corrupção. Renunciou alegando reação dos seus próprios parceiros udenistas.

Com a ascensão do trabalhista João Goulart, o primeiro movimento da UDN e da direita lacerdista foi a tentativa de limitar o poder do novo Presidente, através da criação de um sistema parlamentarista. Para isto, foi designado pelo Parlamento, de forma indireta, o avô de Aécio Neves, Tancredo, para o primeiro e fracassado mandato como Primeiro Ministro.

O exercício parlamentarista foi tão mal sucedido, que o presidencialismo voltou com a força das reformas de base através de plebiscito.

Vencida a ditadura militar, em 1989 o Brasil passou por sua primeira eleição direta e realmente democrática. Após um processo eleitoral com inúmeros candidatos, chegaram ao segundo turno um representante dos movimentos que lutaram contra a ditadura, Luiz Inácio Lula da Silva (Partido dos Trabalhadores – PT), e um playboy alagoano, cognominado pela mídia de “caçador de marajás”, Fernando Collor de Mello (do extinto Partido da Renovação Nacional – PRN).

Aliás, é estranho como partidos e grupos conservadores gostam de se afirmar como agentes da renovação. Primeiro Collor, depois FHC, Serra, Alckmin, Marina Silva e, agora Aécio Neves, também playboy, e também um apelido de falsa eficiência: “o homem do choque de gestão”. De novo, todos apresentaram as mesmas propostas: política internacional subordinada aos Estados Unidos, privatização do patrimônio público, diminuição dos investimentos públicos diretos, “enxugamento da liquidez do mercado” (leia-se, redução do consumo e do emprego) e liberdade plena ao capital financeiro.

Dentro de um processo eleitoral disputado, que foi decidido por menos de 2% dos votos válidos, Lula foi atacado diretamente por golpes de baixíssimo nível, como uma suposta ex-esposa abandonada, e uma versão editada do debate realizado na véspera da votação, medida esta que foi objeto de documentários e reportagens da imprensa internacional e admitido pelo próprio editor da Globo, José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, mas somente anos após. (o vídeo pode ser acessado no YouTube, ou no seguinte link: http://www.diariodocentrodomundo.com.br/boni-lembra-da-manipulacao-no-debate-lula-x-collor/).

Mas a maior manipulação política das eleições de 1989 foi realizada com o fim do sequestro do empresário do setor de supermercados Abílio Diniz, que, libertado de seu cativeiro no dia da eleição, teve seus sequestradores, dois estrangeiros, apresentados pela polícia vestindo camisetas do PT.

Com ampla cobertura da Rede Globo em rede nacional, e com matérias do Estado de São Paulo e da Folha no dia seguinte, o golpe foi apenas mais uma das artimanhas adotadas pela mídia, conforme admitido posteriormente pelos sequestradores, que narraram terem sido obrigados pela polícia paulista a vestir as camisetas do Partido dos Trabalhadores para que isto fosse mostrado nas imagens da mídia. Hoje, não se encontra, qualquer que seja o termo de pesquisa utilizado, um registro sequer dessas imagens, tamanha a vergonha e descaramento daqueles que manipulam os meios de comunicação.

Posteriormente, vários escândalos foram criados, todos sem conteúdo probatório e arquivados por absoluta falta de provas. Basta lembrar os ataques contra a assessora de Dilma, Erenice Guerra, em 2010.

O roteiro do caso Erenice explica como funciona o esquema de injúrias morais e difamação posto em prática pela mídia monopolista. Vejamos: o desconhecido Fábio Baracat, lobista do submundo do setor de transportes, afirmou que o filho da gestora cobrava propina de empresas para oferecer facilidades em licitações. A Revista Veja estourou o escândalo no sábado, e a Globo deu ampla repercussão, e passaram semanas batendo incansavelmente no assunto. Como elementos de sustentação, nenhuma prova material, nada palpável, nada irrefutável. A única pretensa prova consistia apenas na matéria difamatória da referida Revista. Foi aberta uma investigação na Polícia Federal, arquivada por absoluta falta de provas em 2012.

Pois a encenação retorna em 2014 com um cenário menos criativo, e com personagens sem nenhuma moral. O doleiro Alberto Youssef, e Paulo Roberto de Souza, que havia sido nomeado para cargo de dirigente na Petrobrás na gestão de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) no Planalto.

Nos vídeos divulgados pela Rede Globo e afiliadas, apenas o teto de uma sala, supostamente da Polícia Federal. Não aparece ninguém, nem é possível afirmar com certeza se os entrevistados são realmente os dois personagens alegados. São apenas vozes falando sob o teto.

Mais do que isto, em todos os vídeos as pessoas relatam fatos que “ouviram falar”, ou que “todo mundo sabia”. Ou seja, não há nem testemunho, apenas ilações! Na linguagem popular, “fofocas de bastidores”.

Também não há perícia, nem prova de que os vídeos sejam verdadeiros. Somente a lamentável manipulação de dados e informações.

Desde o caso PROCONSULT, em 1982, quando Leonel Brizola foi vítima de um sistema informatizado fraudado de apuração de votos, passando por 1989, 1994, 2002, 2010, até hoje, apenas a qualidade da manipulação das informações vem piorando. Em 1989 eram os sequestradores, hoje é o telhado falante. Qual será o próximo evento?

Particularmente, espero que nenhum. Cabe ao Ministério Público investigar os responsáveis pela manipulação das informações e colocá-los na cadeia. Se os vídeos divulgados forem reais, além de frágeis como prova processual, fariam parte de um processo que corre em segredo de justiça.

Os processos correm em segredo de justiça porque é dever da polícia preservar tanto as investigações como a imagem de pessoas que não podem ser acusadas sem provas, inclusive das que acusam. Ouvir falar, não é nem prova testemunhal, mas a divulgação de provas de processo em segredo de justiça é crime tipificado no art. 325 do Código Penal.

 

8 comentários

  1. Isso é muito grave e precisa ser divulgado rapidamente, sob pena de produzir mais danos. Acho, porém, que o povo já está bastante desconfiado dessa sequencia de “escândalos” forjados, os quais devem ser investigados e punidos rigorosamente sob pena de sempre se repetirem, fazendo algum dano em alguns patetas ou desavisados, que ainda dão crédito às Vejas e Gllobos da vida.
    Vamos à luta até a vitória de Dilma 13 e Tarso 13…

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